Formas de cozer o ingrato do polvo

O malfadado polvo!


Como já todos sabem, neste, no outro hemisfério e mais além, eu não gosto de cozinhar. Mas de vez em quando, e, algumas vezes, todos os dias, lá marcho eu para a cozinha. Não carrego no sal nem nos picantes, mas adoro pimenta com tudo, muitos oregãos e uma pitada de caril. Cozinho a olho, uso a mão como colher de medida, provo vezes sem conta até acertar, trinco para ver se está cozido, assado, grelhado e tudo o mais...Se pudesse comia tudo cru, é o que eu digo, mas, convenhamos, cru só mesmo frutas e legumes, possivelmente eu sou uma vegetariana em potência! Adoro saladas e frutas, porque será? Pronto a comer, nada melhor!

Dantes as receitas de culinária só existiam nos livros de cozinha, pouco ilustrados e pouco atraentes, nas revistas da especialidade já eram mais sedutoras, e nas revistas femininas não faltava o cantinho da boa comida. Depois a televisão trouxe os programas sobre a culinária, cada um mais aborrecido que o outro, foi preciso juntarem-lhe mais alguns ingredientes, as histórias de viagens, como no meu preferido No reservations, para eu me aguentar além do genérico. Hoje entro nas livrarias e não faltam livros repletos de fotografias apetitosas e receitas com títulos exóticos. Ou nos hipermercados, bem perto dos víveres e dos condimentos, eles lá estão, grandes ou em formato de bolso, magros ou gordos, as receitas de toda a gente, desde chefes afamados a estrelas de grandeza duvidosa, toda a gente quer partilhar o que sabe sobre o assunto, as receitas reinventadas, há de tudo para todos, para quem gosta de cozinhar e para quem detesta, para quem não tem tempo, etc. É tudo de comer e chorar por mais, pois os olhos também comem, Photoshop q.b não falta às saladas, nem aos assados, muito menos às sobremesas e petiscos. Está para elas como o sal para o grosso da cozinha. Eu já caí na tentação, comprei uns livros sobre cozinha japonesa, mas, claro, nunca tentei fazer nada. Estão na estante, longe da cozinha, misturados com os livros sobre a filmografia do Kenji Mizouguchi e álbuns da manga! Possivelmente comprei-os seduzida pelo bom design e levada pelo meu fascínio pelo Japão e não tanto por desejar fazer Sukiyaki, Yakizakana, Udon...pois, pensavam que eu ia escrever Sushi?! Isso era se eu nunca tivesse comprado os livros! Posso não saber preparar nada, mas sempre enriqueci o meu vocabulário.

Mas nos dias do Google, a comida também conquistou a internet e não faltam sites e blogues repletos de receitas e lindas fotografias de fazer crescer água na boca. A sempre disponível internet é a minha melhor conselheira a seguir à fonte primordial nestas matérias: a mãe. A mãe sabe sempre a melhor forma de preparar um prato. Por isso hoje liguei-lhe a perguntar sobre o arroz de polvo que tinha de preparar para o jantar.

O polvo é um bicho traiçoeiro. Encerra pelo menos oito hipóteses de sair mal, uma por cada braço. O polvo e a árvore da borracha devem ter um antepassado comum e não raras vezes o bicho resolve lembrar-nos disso e estragar-nos a festa. Ao cozinhar polvo convém ter um plano B, B de bolinhos de bacalhau, por exemplo, B nem que seja de Bananas. Liguei à minha mãe e ela, solícita, disse como fazia a coisa, garantidamente sairia bem seguindo alguns passos simples. Pois não saiu. Entrou um polvo médio no tacho e a meio do evento culinário ocorreu a mutação: o animal mirrou para metade e transformou-se em borracha. Para esquecer. Felizmente havia um plano B.

Intrigada com o desfecho do meu jantar resolvi colocar a pergunta ao Google - Google meu, Google meu, existe alguma forma de preparar polvo mais tenrinho do que o meu? Bem vinda ao mundo fantástico, bizarro e divertido das mais diversas formas de bem cozer o polvo! O oráculo dos tempos modernos brindou-me com respostas para todos os gostos. O polvo deve ser a cobaia da cozinha! Anda cada um a experimentar uma técnica diferente, todos anseiam o mesmo resultado - que o polvo não se transforme numa pastilha elástica depois da cozedura!! Achei algumas das sugestões tão divertidas que fiz uma pequena compilação sobre formas de cozer polvo. Ei-las!!

Seja simples, não invente! - Lave o polvo em água fria e coloque-o numa panela, lume no mínimo! Não junte mais nada. O polvo vai perdendo a sua própria água e é nessa água que o polvo vai cozendo lentamente. O tempo de cozedura depende do seu tamanho - um polvo pequeno demora aproximadamente 1 hora, e um polvo médio aproximadamente 2 horas.

Seja rápido, faça pressão! - Cozinhe o polvo na panela de pressão, é rápido e económico. Lave o bicho, que fique bem limpinho, e depois panela de pressão com ele, sem água mas com umas pitadas de sal, a gosto. Que fique pressionado durante exatos 14 minutos contados após o início da fervura, ou seja, quando a panela começa a soltar pressão.

Seja violento! Bata no polvo até perder as forças! Embrulhe-o num pano limpo e use um martelo de madeira, um daqueles dos bifes, ou uma pedra, uma moca, qualquer coisa assim! Ou bata-o no asfalto - é verdade, encontrei alguém a partilhar com o mundo que a mãe ia bater o polvo na estrada!!

Seja cauteloso! - Descongele o polvo e coloque-o numa panela com uma pitada de sal e uma ou duas cebolas com casca. Leve a panela ao lume e logo que levante fervura conte cerca de 35 a 40 minutos, depois é desligar o lume. E agora a parte mais importante: deixe o animal arrefecer dentro da água da cozedura. Nunca o retire de imediato, enquanto a água está bastante quente...ele pode-se constipar! Há quem o deixe de molho para o dia seguinte!

Seja frio! - Quando o polvo é fresco deve congelar-se e descongelar antes de cozinhar. Só assim ficará tenro.

Seja pró-americano! -Para que o polvo fique macio junte à água de cozer uma cebola e um copo de coca-cola. Ao fim de pouco tempo (depende do tamanho do polvo) tem polvo muito macio e com os tentáculos todos intactos, e não saberá a coca-cola.

Seja fresco! - Se quiser utilizar polvo fresco, sem congelar, peque no polvo pela cabeça, os tentáculos devem ficar todos escorridos, isto é, com as pontas bem penduradinhas, sem enrolar, pois polvo que enrola só serve de bola!

Seja cortante! -Experimente cortar as pontas dos braços do polvo. Não mirra e rende. Ao cozer um polvo, junte uma cebola crua, quando a cebola estiver cozida, o que saberá picando-a com um garfo, o polvo também está.

Seja adepto da reciclagem das rolhas ...?! Para o polvo ficar bem tenro, quando o for cozer, junte na água uma rolha de cortiça.

Seja bem português! -Coza com um copo de vinho tinto e outro de água, na panela de pressão, meta um fado a tocar para acompanhar. E adicione o sal apenas no fim da cozedura. Aproveite o líquido para cozer arroz para o qual já fez um refogado clássico. Depois do arroz cozido, junte o polvo em pedaços. Na hora de servir junte coentros picados.

Seja Galego! - Nas Rias Bajas, os galegos cozem os polvos em água com sal durante cerca de hora e meia e, a meio da cozedura, tiram-nos do bidão onde os cozem e mergulham-nos por um momento em água gelada.

Seja meticuloso! -Limpe o polvo e coloque numa panela de pressão com um fio de azeite de oliva e uma colher de chá de sal. Coloque o polvo com os tentáculos para baixo e as ventosas para cima. Depois do primeiro apito deixe cozinhar por 12 (doze) minutos, desligue a chama e espere 5 minutos. Liberte a pressão. Está pronto e bonito!


Em actualização! Aceito contributos!

Comentários