TV movie - A ilha do tesouro, de Steve Barron (2012)




Antes de Jack Sparrow, houve Long John Silver! Antes de Sparrow os piratas não tinham piada alguma, eles eram tenebrosos, temíveis, ardilosos e indignos de simpatia. Escrito em 1883 por Robert Louis Stevenson, A ilha do Tesouro foi a primeira história com ilha, mapa e tesouro dentro, e, claro, muitos piratas! A história do jovem Jim Hawkins que vai até ao mar das Caraíbas à caça do tesouro do pirata Flint já foi adaptada para o cinema e para a televisão dezenas de vezes. Há um filme mudo dos anos 20, mais tarde vieram séries e fitas sonoras, diversas, relembro Orson Welles no papel de Long John Silver numa delas. Agora, foi a vez de uma mini-série do canal inglês Sky1, que vi ontem à noite, e para o ano li que Guy Ritchie também lhe vai deitar a mão, podemos esperar desde já uma Ilha a la Sherlock Holmes, muito dinheiro, muito show. Esta Ilha de Steve Barron é discreta, mas vale a pena ser visitada, entrem a bordo!

Quando Sparrow deu à costa no mastro do navio, muitos disseram que ele tinha ressuscitado um género de história enterrado no tempo. Mas, na realidade, os piratas nunca estiveram fora de moda, apenas mudaram de ramo! Hoje são os piratas informáticos, ontem eles cruzavam os mares à procura de saques grandiosos! Falar à pirata tornou-se uma moda com direito a dia internacional e tudo, foi em Junho de 1995 - Talk like a pirate day! A brincadeira foi criada pelos norte-americanos John Baur e Mark Summers, inspirados pelo livro A Ilha do Tesouro e pelo filme Barba Negra - O Pirata (1952), o patrono do dia. Tudo porque enquanto jogavam uma partida de squash um deles disse Arrrrr!! Há gente com imaginação até para criar um dia internacional do falar à pirata!

Este fim-de-semana realizou-se o 2º Festival Pirata, em Buarcos. Aqui na Figueira da Foz o pessoal gosta de navegar contra a corrente, esperar pela data oficial do Dia Internacional de falar à pirata, de 19 de Setembro, não entrou nas previsões dos organizadores, 20, 21 e 22 de Junho é perfeito. Ergueram-se as tendas de mercadores, artesãos, regatões, taberneiros junto ao forte, malabares, animadores e curiosos enchem o recinto, o ambiente é de festa até que, na praia, acontece um desembarque de piratas, segue-se um cerco, escaramuças e muito pouco parlamentar! Os soldados pegam em armas, a população ajuda e os maus são capturados, os piratas, claro, e...festeja-se rijamente com comes e bebes! Arrrr!

Mas eu ia apenas escrever umas linhas sobre esta recente mini-série ou telefilme de três horas e tal, do canal Sky1. Começa e viajamos desde os sombrios espaços rurais de Devon e Cornwall, passando pela agitada Bristol, até ao mar radioso das Caraíbas. Os piratas estão bem enroupados, o guarda-roupa é realmente bem conseguido, a tripulação é multi-étnica, o barco Hispaniola é uma beleza, a ilha é como esperamos que seja, uma mancha verde rodeada de azul. Estamos a milhas da comédia do blockbuster Piratas das caraíbas, de Hollywood. Aqui há drama. A primazia é dada à história, tudo é feito com tempo, algumas vezes com tempo demais - o ritmo do filme nem sempre satisfaz. Podia ser mais rápido e mais curto e nada se perderia. Steve Barron comandou e obviamente não quis um filme de acção. Não que não existam lutas, que as há, mais naturais e realistas do que nas aventuras que vimos com Sparrow, mas há sobretudo tempo para cada personagem se desenvolver, amadurecer, em especial o jovem Hawkins, a cargo de Toby Regbo, que começa o filme menino e termina um homem feito. Os outros actores são Eddie Izzard, Elijah Wood, Philip Glenister e Rupert Penry-Jones. Donald Sutherland é o Capitão Flint, o pirata que se tornou lendário pelo seu tesouro e barbárie. Mas aparece e desaparece apenas por breves minutos e não chega a brilhar. É Eddie Izzard quem está no centro das nossas atenções ao longo de todo o filme, antes a personagem de Long John Silver já foi interpretada por Robert Newton, Charlton Heston e Tim Curry. É surpreendente na sua ambivalência, desde o princípio ao fim do filme, não nos cansamos de o ver, uma mistura subtil de humor, malvadez e estilo - Jack Sparrow, toma cuidado!! No polo oposto está Ben Gunn, a cargo de Elijah Wood, um tontinho que a tripulação deixou para trás na ilha e que enlouqueceu, menos Frodo e mais pirata, era o que se pretendia, mas não! Já li o livro há muito tempo e não me recordo de, no final, Jim Hawkins lançar o tesouro ao mar, creio que ele escapava com dinheiro e que Long John Silver desaparecia! E o escudeiro Trelawny passou de homem aventureiro no papel a ganancioso sem limites, também é punido com a morte! São as liberdades que os realizadores se permitem mas que transformam radicalmente a mensagem da obra original. Ainda assim, e também porque entendo que um filme não tem que decalcar o livro fielmente, fiquei com uma impressão muito agradável desta Ilha do tesouro. Não é um tesouro, nem uma pérola do cinema, nem será certamente "the television event of the year", como avançam no péssimo trailer acima!! Mas esta nova adaptação do livro de Stevenson garante algum entretenimento sério na sua abordagem à natureza incorrigível dos dos piratas e suas aventuras, e, convenhamos, já fazia falta como contrapeso à estonteante loucura de Sparrow. Arrrrrr!

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