O horror em Psycho, True Blood e pintura gay


Os meus visitantes já deviam ter saudades do cabeçalho do meu blogue. Ele voltou. Tenho estado a fazer algumas experiências com o Adsense e isso implicou uma reviravolta no template.Só isso. Mas a cabeça de Marion Crane, a secretária de Psycho, ou de Janet Leigh,a actriz,replicada em movimento concêntrico, não era para apagar do mapa. Eu gosto muito daquela cara aflita. Alfred Hitchcok dirigiu-a neste filme em 1960. Ela é a mulher brutalmente assassinada no chuveiro e esses breves instantes bastaram para ser nomeada para o Óscar da melhor actriz secundária. Acabaria por receber um Globo de Ouro pela sua interpretação. 

A cena é verdadeiramente arrepiante. Janet nem sempre está em campo, isso não é necessário para nos transmitir toda a emoção associada ao seu assassinato. Esta cena tornou-se um clássico do cinema. O seu segredo é o trabalho de edição de George Tomasini. Pela arte e engenho que demonstra e pela onda emocional de terror visual que perdurou por gerações de cinéfilos, a cena do chuveiro viria a ser modelo e fonte de inspiração para inúmeros realizadores. Também a música estridente de Bernard Hermann que acompanha o ataque do assassino se fixou na memória colectiva dos cinéfilos para sempre. O terror não tem de ser um género menor. Mas,confesso, não é dos meus géneros de eleição e eu não procuro ver o que se continua hoje a produzir dentro dessa linha embora conheça alguns clássicos. Alimentar a minha memória de histórias inquietantes não me diverte por aí além. 

Segundo se pode ler em muitas fontes o realizador usou o preto e branco para que as audiências não se sentissem tão chocadas com a presença do sangue e evitou cenas de nudez em virtude da censura da época. Ora, não sendo eu fã de terror, como é que fui escolher a cabeça da Janet para andar por ali aos rebolões no cabeçalho?Certo que as palavras podem ser tão cortantes como facas. Se bem que eu nem sempre estou com ganas para cortar a direito por um assunto adentro, às vezes ando um pouco às voltas, com rodeios, e acabo por não ser nem tão directa nem tão agreste como às tantas os assuntos mereciam.Se a gente quer ter visitantes por aqui tem de os tratar bem. 

Não vamos transformar este espaço num massacre. Já existem muitos outros assim.O meu registo é sempre light. Ou quase sempre.Mas um destes dias aconteceu por aqui um fenómeno. De uma assentada um número interessante de leitores deste blogue disseram bye-bye. Fiquei sem saber qual o motivo pois na sua maioria quem aqui entra vem pela calada e sai mudo como entrou. Fiquei a pensar se não teria sido somente coincidência mas alguns dos meus últimos escritos talvez não tenham caído no goto de alguns.Um dos post, discreto, era sobre uma artista plástica que pintou uns quadros muito gay, outro sobre criaturas que estão mortas e que sugam sangue à noitinha. Entre a realidade de um dos temas e a ficção de outro não falta quem se sinta agredido pelas palavras, atingido na sua sensibilidade, e está no seu direito. Sobre os gays eu não tenho nada a dizer.É uma questão,quanto a mim privada. A lei passou no Parlamento. Eu levantei-me no dia seguinte e o preço da água e luz continuava o mesmo, o pão, o leite e a alface estavam à venda no supermercado e sabiam igual. A taxa de desemprego permanecia na mesmíssima senão maior, os culpados passeavam-se na TV dizendo não ter culpa, as estrelitas cor-de-rosa enchiam as revistas em poses pindéricas. Havia decerto gente nos balcões das Conservatórias a pedir certidões para tratar de divórcios amigáveis, outros a casar nas igrejas e outros ainda a juntarem os trapos debaixo do mesmo tecto sem aparatosas celebrações. Enfim, o que essa lei fará mudar na vida de poucos em nada afectará a vida de muitos, incluindo a minha. Depois da Zina Saunders me ter dito que tinha recebido hate mail à conta das suas pinturas e entrevistas fiquei a pensar. Mas não por muito tempo, como devem imaginar. 

Já no plano da ficção, e porque hoje calhou lembrar-me da Janet, não deixa de ser curioso constatar como evoluiu a receptividade das pessoas à violência mais ou menos explícita. Quem é que hoje se arrepia com Psycho? A dose de horror ainda é suficiente ou à conta de tanta convivência com imagens chocantes,imaginárias e reais, precisamos agora de muito mais para nos arrepiarmos?Interrogo-me se Hitchcok filmaria hoje o Psycho de forma diferente daquela que usou em 1960. Nessa época ele tinha a censura à perna. Nem um mamilo podia aparecer na tela. Imaginem que era ele hoje que estava no comando de True Blood/Sangue fresco e que tinha carta branca da HBO para fazer o que quisesse. Hitchcock percebeu claramente o potencial da televisão e entre 1955 e 1965 apresentou e produziu o programa Alfred Hitchcock Presents. Por isso pensá-lo a dirigir True Blood não é algo assim tão despropositado. Ele, que em 1960 não quis fazer um filme a cores por achar que seria muito chocante para o público ver sangue vermelho! Mas, pensando bem, Hitchcok nunca precisaria de usar muito sangue. Como filmaria o True Blood de Alan Ball-que eu continuo à espera que alcance o esplendor de Sete palmos de terra, também de Alan Ball? O terror do Mestre do suspense não vive do explicitamente gráfico e antes da psicologia da mente humana. Criou um dos melhores filmes de terror de todos os tempos com sangue a preto e branco-era calda de chocolate- e sem nudez. Wow!Isso é possível?!Muitas vezes nomeado para o Óscar de realizador, nunca ganhou.Mas hoje,50 anos depois,aqui estou eu a escrever sobre Psycho. Quem é que daqui a 50 anos irá escrever sobre True Blood/Sangue fresco?Pensem nisso.

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